lunes, 13 de octubre de 2008

Com o desconforto da alma mal-entendendo (Tabacaria)

Tengo el día cínico, así que iba a poner un fragmento de O Guardador de Rebanhos, de Caeiro. Yo siempre he sido Álvaro de Campos y una vez dije que no hay un solo día de mi vida que no pueda describirse con un verso de Tabacaria. Ni uno. Amo al Álvaro de Campos que quiere ser como su mentor y lucha contra la metafísica, aunque la metafísica siempre gane y aparezca, pérfida, en los lugares más insospechados: un estanco, un envoltorio de chocolate...

El otro Álvaro de Campos, el futurista, me resulta bastante indiferente.

Vale, no soy Álvaro de Campos del todo. Sólo un poquito. Pero es mi heterónimo. El ciclotímico. Que la mitad positiva de mis ciclos vaya por derroteros diferentes a los suyos no implica que no sea inquietante el parecido de la mitad negativa.

No tengo nada contra Pessoa en sí mismo ni contra Ricardo Reis. Admiro muchas cosas de uno y me parece sublime el encanto clásico del otro. Ni siquiera contra todos los demás, varios en francés y en inglés. Pero reverencio a Álvaro de Campos, a Caeiro y a Bernardo Soares. Por este orden. Y a Pessoa en su conjunto lo considero insuperable.

Tabacaria es tan la historia de mi vida que estaba segura de haberlo dejado aquí. No así el otro, el que sí puse. Pero hoy el mundo funciona al revés y yo tengo que poner Tabacaria.

Es demasiado largo para poner dos versiones y nunca he encontrado una traducción que me convenciera del todo, así que queda sólo en portugués. Pero no es difícil y google está lleno de traducciones. Seguro.

Sí, el verso de hoy es el que está en el título.


    TABACARIA

Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.

Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.

Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.

Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei de pensar?

Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Gênio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim.
Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim...
Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando?
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;
Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num poço tapado.
Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
O seu sol, a sua chava, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordamos e ele é opaco,
Levantamo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.

(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)

Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.

(Tu que consolas, que não existes e por isso consolas,
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)

Vivi, estudei, amei e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente

Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.

Essência musical dos meus versos inúteis,
Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.

Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o deconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,

Sempre uma coisa defronte da outra,
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.

Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.

Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.

Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.

(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.

    Álvaro de Campos, 15-1-1928

Además, os dejo un cuadro de Hopper. Uno que ya había dejado, pero me da igual.

15 never more:

Comtessa d´Angeville dijo...

Tabacaria me suena a Tabarca, que es una isla que es mi isla, a sólo once millas de Alicante, que es donde una va cuando no le queda otro sitio a donde ir, que es pequeña y no tiene gente, en invierno tiene muy poca, veinte personas si llega...

Y oiga, tome ejemplo de servidora: exijimos posts bilingües!!

Comtessa d´Angeville dijo...

Ahora puedo decir que también es tan historia de mi vida.

Comtessa d´Angeville dijo...

Querida yo en esta vida he hecho de todo, de todo de todo de todo.

¿Sabes lo de la masota realvisceralista? Me he comprado una cerda y le he puesto Caborca, como la revista de Cesárea Tinajero (Bolaño, detectives salvajes, ya tardas en leer)

Comtessa d´Angeville dijo...

hay que ser polivalentes nena! Que vienen tiempos de crisis y una tiene que saber hacer de todo pa que la contraten!!

A la mierda la tesis mujer! Más Bolaño y menos tesis! Espera a ver si tengo tiempo ahora luego y te mando una foto de la cerda, que es una monada!!

Isabel Tejada Balsas dijo...

y sigue el pesimismo por lo que veo :/

Val dijo...

Amei esta ilustraçao.. parece com uns esboços que tenho feito .. e animo!!!!

Isabel Tejada Balsas dijo...

ajajajaj vale vale, mil perdones, busqué una traducción y claro, pero me alegro, a mí no hay nada que me espabile más que mi simpatico cinismo y sarcasmo, de hecho tengo fama de esto :P


uhmm, todo lo inerte es poco aconsejable cuando una está viva, al menos viva en teoría, pero a veces lo inerte se impone, por desgracia...de todas formas el cosmos del que hablo es pasado, aunque dolió más el como murió que su muerte :/


k asko de ciudad la mía, había un taller de escritura creativa al que me iba a apuntar y hoy me han dicho que no se hace por falta de gente, estoy que muerdooo ¬¬

Comtessa d´Angeville dijo...

Nena te he mandao foto al mail.

Mi cerdaaaa!

Mi hombre (el que vivo conmigo, puntualizo) está cabreado porque se ha comido media manga de una chaqueta de Ralph Lauren. Es muy cerda en ese sentido, en el de comérselo todo.

Unknown dijo...

¡hala, qué de comentarios! :D

si soy precisa en términos lo que yo estoy haciendo es un POP, un programa oficial de postgrado de esos, en términos antiguos el doctorado... :D

Gacela dijo...

(Te he escrito un mail contándote lo de los comentarios que me preguntaste, estará esperando en tu correo, a ver si te sirve!!)

S. dijo...

A mí me encanta ese cuadro de Hopper, así que también me da igual que lo dejes de nuevo. De hecho estoy pensando en dejárselo de fondo de pantalla a la computadora de mi hermano, en la cuál me encuentro, pero no sé cómo vaya su sentido del humor últimamente y me debe unos cuantos libros. Ajam.

No estoy muy segura de todos los argumentos que relacionen las rosas con la locura, porque mi profesor resumió excesivamente la conferencia al respecto. Pero más o menos dejaba como conclusión de que eran la flor más relacionada con esta condición. Si averiguo algo más te doy los detalles.

Suena genial el programa de estudios medievales. Durante mucho tiempo pensé en irme por ese lado e incluso puede que mi tesis sea de literatura medieval. Pero ahora no estoy segura de nada, tanto como que al final no hago nada :/

Es curioso que por ahí no llueva y yo ayer me encontré atrapada en una tormenta de agua y granizo que convirtió mi noche en una momentánea película de terror, sin protagonista.

Besos.

Comtessa d´Angeville dijo...

Correcto, mi compañero de casa/cama (pero no pareja, que de eso ya tiene desde once años, esto dura sólo hasta diciembre que él se embarca) es un capitán pijo de polo RL. La cerda es una cerda y yo... yo ando todo el día riéndome con sus trastadas.

Isabel Tejada Balsas dijo...

La deliciosa delicia de Delirio es mi inspiración y ella lo sabe, pero no fue en la piscina sino en su reinohueco donde descubrí a esta maravillosa fotógrafa. Uhmm, hoy me he pasado por la piscina y me da que voy a repetir, sí sí

¿Andas insomne tú también? :O

Isabel Tejada Balsas dijo...

uhmm, vámonos pues a jugar a ese juego, a ver si tenemos suerte y ganamos las dos :)

Por cierto linda, se te echa de menos en el fotolog, que lo sepas n_n

Un besazo de osa .*

Sergio dijo...

Y ya van dos poetas muy diferentes pero que se hacen iguales escribiéndole al dolor. Yo soy muy Pessoa, en general, pero reconozco que este poema es uno de los mejores que escribió nunca o que se ha escrito nunca, así, en general.
Hace dos días que me levanto con el cielo nublado en Barcelona y cada vez me encuentro con una referencia literaria tuya más deprimente. Me gusta mucho a la vez que me induce un poco más al suicidio que no me atreveré a realizar nunca. La vida duele más cuando eres lúcido. Y si no que se lo digan a Pessoa.
Por cierto, haces bien en odiarme por vivir cerca del festival de Sitges. Hace muchos años que lo visito(aunque a veces se me escapa, no sé por qué). Nunca me decepciona su ambiente. Y yo también soy un fan del terror y del gore y de ciertas películas que mi razón critica pero mis gustos adoran. Mi sueño es pasarme una vez toda la semana allí viendo dos o tres películas diarias.